- A história de Argaron
- Raças de Gheldor
- Magos em Argaron
- As escolas de magia
- Estrutura política e social de Argaron
- A ordem dos Iohani
- Harnan em Argaron
- A religião Nuradin
- As doze virtudes
- Hora e calendário
- O relógio dos Ilori
- Perícias especiais de Gheldor
- A história de Ter'andrinn
- Estrutura política e social de Ter'Andrinn
A criação do Universo segundo Cardan, Ardran do Demiurgo.[]
Os 4 princípios
Existem 4 princípios que Iulan deu a cada alma, cuja combinação formam o que é chamado de essência prima. Estes são: A vontade, que as almas herdaram de Aniria, a memória, que as almas ganharam por verem Aur, a inteligência, que as almas ganharam por cantarem, e a Verdade, que as almas ganharam por estarem com Iulan. A Vontade permite que as almas se movam e mudem, mas pode levá-las ao desejo, que ás impede de sentir a vida. Ela corresponde ao elemento Fogo. A memória permite às almas conhecerem umas às outras, mas pode afogá-las na passividade da loucura, que é o fim da identidade. Ela corresponde ao elemento água. A inteligência permite às almas a manifestação das possibilidades, que é a combinação das notas de Iulan, mas pode levá-las à asfixia da vaidade, que é a possibilidade de destruir-se. Ela corresponde ao elemento Ar. A Verdade permite às almas a plenificação da Justiça, mas pode levá-las à pobreza do medo, que é a ilusão do nada. Ela corresponde ao elemento Terra. |
Cardan Disse:
“O universo é uma criação fictícia que não tem substância própria, é a falta de peso da ausência de desejos do Demiurgo”.
“O Demiurgo é o ser incompreensível cuja existência é uma necessidade para a mente funcionar. Se ele não existir, o próprio pensamento seria ilógico, mas a sua existência é incompreensível. Basta saber que ele É, e que o Universo, como ele pode ser conhecido, não foi criado pelo Demiurgo assim como uma nuvem não cria a chuva. Faz parte da natureza da nuvem chover, assim como o Universo faz parte da natureza do Demiurgo”.
“No início do tempo, havia uma terra além dos sonhos chamada Elausir. Nesta terra está Iulan, o reflexo do Demiurgo, e tudo era a sua respiração”.
“Iulan, vendo que haviam inspirações que não eram expiradas e expirações que eram iguais às inspirações, desejou que todos fizessem parte de um único movimento”.
“Ele, então, produziu um imenso cristal, que ele chamou Aur, e com um sopro seu, destruiu o cristal, fazendo-o em incontáveis pedaços”.
“Em Elausir, estava a alma da fertilidade, consorte de Iulan, chamada Aniria. Aniria teve medo da quebra de Aur, e tentou esconder-se da destruição deste”.
“Porém, quando o cristal foi despedaçado, Aniria não havia conseguido se ocultar totalmente, e quando Aur foi destruído, ela, que era una, passou a ver a si mesma e conhecer a si mesma apenas pelos milhares de reflexos de Aur”.
“Iulan conheceu, então, Aniria como incontáveis reflexos diferentes, e a cada um destes, ele chamou Alma. Porém, uma parte de Aniria havia se ocultado da quebra de Aur, esta parte, passou a ser iluminada apenas pela sombra dos reflexos das almas, e desejou desaparecer, porque não podia mais se iluminar com os reflexos de Aur”.
“Iulan se compadeceu de Aniria e resolveu ele mesmo insuflar vida à sua parte oculta, iluminando-a com uma outra luz. Assim, a parte oculta de Aniria ficou iluminada de dois lados. Um, pelas sombras das almas, e outro, pela luz direta de Iulan, e Iulan chamou esta parte antes oculta de Ardran, e os fez vários e grandes para também se alegrarem como a almas”.
“Mas as almas estavam inquietas, porque conhecendo apenas um reflexo de Aur, ansiavam pelo todo, que estava no passado do qual elas ainda se lembravam. Iulan, então, deu às almas a voz, para que elas pudessem encher Elausir com o Som”.
“E as almas então conheceram a música, e o primeiro som que elas ouviram, o primeiro som que todas as almas podem se lembrar, é o da música de Iulan quando ele lhes entregava a voz”.
“E as almas criaram cada uma sua música, e cantavam consigo mesmas e com as outras, e não perceberam que entre cada nota havia um silêncio, e era neste silêncio que elas retinham o máximo do seu desejo, e que quanto mais cantavam, mais colocavam sua vontade no silêncio, e assim perdiam a si mesmas”.
“Iulan, sabendo disso, deu às almas o sono, para que elas pudessem parar de cantar por um tempo, e ouvirem a sua própria canção enquanto dormiam. E o mundo dos sonhos, Far’andrin (literalmente: reino das emoções), foi inundado com as almas, e passou a refletir a música que elas cantavam”.
“Em Far’andrin as almas sentiam sua música enquanto descansavam no silêncio, mas faltava-lhes a experiência completa. E, incapazes de se plenificarem no que criavam, conheceram o desespero”.
“Então, Theolan, um dos Ardrans de Iulan, criou para as almas o mundo de Gheldor, aonde elas poderiam entrar através do sonho dos sonhos, e plenificarem-se por viverem a música que criavam como se elas mesmas fossem as notas que tocavam”.
“Iulan, vendo isso, percebeu que Gheldor era um mundo dual, no qual as almas poderiam se plenificar ou perder. Ele, então, ordenou aos Ardrans que não mais criassem mundos para as almas, e cantou para os Ardrans, que não tinham vozes próprias, a sua canção, para que eles também pudessem entrar em Far’andrin e em Gheldor, e ajudar as almas a encontrar o caminho de volta”.
“E foi assim, e por este motivo que Gheldor foi criado, e os Ardrans vieram a morar com as almas para satisfazer a vontade de Iulan, o seu Criador, e não deixar que houvesse uma só alma que não conhecesse a Vontade, Memória, Inteligência e Verdade, e todas por fim retornassem a Elausir, aonde, cada qual refletindo em si uma música diferente, poderiam por fim recriar Aniria e se reunirem todas na grande respiração de Iulan”.
Os primeiros dias da Criação do Mundo:[]
Os 4 pecados
Dos 4 princípios surgem os 4 pecados, que são as tentativas das almas de se reencontrarem com Iulan sem usarem os 4 princípios. São eles: O desejo, que é a vontade da alma destruir-se, porque é a identificação de si mesma com algo mortal. O desejo impede que a alma saiba o que pode fazer e qual o seu Poder. A loucura é a fraqueza de um ser em não se reconhecer, porque é o reconhecimento do ser com o absurdo. Ela impede que a alma saiba quem é e quem foi. A vaidade é o fim da vida, porque é a tentativa de uma alma de destruir Iulan. Ela mata a alma e destrói sua capacidade de criar. O medo é a cegueira da alma que não enxerga a Verdade. Ele destrói o futuro porque impede a alma de ver o que existe ao seu redor. Para combater os 4 pecados, os Ardrans entrrgaram ao mundo as Leis douradas que servem como guia e luz, um rumo para as almas seguirem dentro de Gheldor. |
Cardan Disse:
“Nos primeiros dias da criação Theolan, Ardran criador do Mundo, respirou em imitação de Iulan, e cada uma de suas inspirações e expirações era chamada de um dia e uma noite”.
“Theolan criou Gheldor como um mundo dual, e o fez em duas operações de divisão por dois, dividindo, assim, o mundo por quatro”.
“Naquele tempo o mundo era uma coisa só que provinha da esperança de Theolan, e a esta coisa Theolan chamou Aur-ha, ou, a luz invisível”.
“Então theolan dividiu Aur-ha em dois e mais dois, criando os quatro elementos que formariam a natureza, reflexos dos quatro princípios de Iulan, que foram chamados pelos mortais de Fogo, Terra, Água e Ar”.
“E assim como, ao desenhar um quadrado, o desenhista imediatamente define o espaço dentro do qual está contido o quadrado, ao dividir Aur-ha em quatro, Theolan estabeleceu o espaço no qual as almas habitariam, e o espaço contido pelo Fogo, Terra, Água e Ar, Theolan chamou de Ain-soph, ou: Infinito”.
“E como a natureza de Iulan repudia o vazio, e não há um ponto do universo aonde não haja vida, ao delimitar Ain-Soph, este foi imediatamente preenchido pelas almas, que migraram a ele atraídas pela promessa da plenificação na música que elas criaram”.
“E foi assim que o Mundo de Gheldor veio a Ser”.
“Depois, Theolan retirou de si mesmo a metade de sua visão e a colocou além do limite do compreensível pelas almas em Gheldor, e dividiu sua visão em tantas formas quantas haviam formas de se cantar a música de Iulan, e fez isso para que as almas para sempre pudessem olhar para cima e lembrar-se de tudo o que elas são capazes de cantar, e nunca se esquecessem da música que elas mesmo cantaram. E a esta metade de sua visão Theolan chamou Ergan, a noite”.
“Mas as almas se desesperaram com isso, porque, lembrando-se da música sem parar, elas sabiam como seriam todas as coisas. E com isso, esqueceram da liberdade e da Justiça, e passaram a crer que tudo estava determinado”.
“Para mitigar o desespero das almas, Theolan então retirou de si mesmo a outra metade de sua visão e fez dela uma porta para a luz direta de Iulan, de modo que quando a sua segunda metade brilhasse sobre as almas, elas nada mais veriam, e seriam tão ofuscadas pela luz de Iulan que se esqueceriam da música. E a esta metade de sua visão, Theolan chamou Ardelion, o Sol”.
“E Theolan, para amenizar mais ainda o sofrimento das almas, fez com que, uma por sua vez, Ardelion e Ergan dividissem o dia, e fez Ergan reinar quando ele inspirava, e Ardelion reinar quando expirava”.
“Mas as almas não conseguiram suportar a luz total de Iulan, e muitas choravam de remorso por haverem entrado em Gheldor, enquanto outras se arrependiam de um dia terem cantado. Theolan, para tornar a Luz de Ardelion suportável às almas em Gheldor, retirou do coração de Gheldor uma lâmina feita de Krilarin, o sangue da terra, e com ela feriu-se mortalmente, sucumbindo em Gheldor. E seu sangue, que espalhou-se pelos céus enquanto ele caía, formou as nuvens, e com elas, a luz de Ardelion foi amenizada, e as almas puderam ver. E é por isso que, sempre que Ardelion dá lugar a Ergan e vice versa, o céu, por alguns instantes, fica avermelhado, porque o sangue de Theolan ainda paira no firmamento de Gheldor”.
“Quando Theolan caiu em Gheldor, ele foi acolhido por Marnya, sua companheira, que lamentou sua perda, porque ele havia criado todo o mundo, e dali por diante ele não mais ouviria a música de Iulan. E as lágrimas de Marnya, misturaram-se às nuvens do mundo, e em algumas delas a sua tristeza ficou tão pesada que suas lágrimas caíram à terra, e caem até hoje”.
“Quando os milhares de almas de Gheldor viram Theolan morto, penalizaram-se pelo sacrifício que ele fez para que elas pudessem viver. Elas reuniram-se próximas a Marnya e, aonde Theolan morreu, ergueram um enorme templo, e ao redor deste templo, uma grande cidade aonde passaram a viver. Este templo foi chamado de Theolanvirannen (a vida eterna de Theolan), e a cidade tornou-se a primeira nação do mundo, chamada Ther’andrin”.
A primeira vinda dos Ardrans[]
Mundos e números
A mitologia de Gheldor acredita em três mundos (Gheldor, Far’andrin e Elausir) e quatro elementos (ou princípios, já vistos). Assim sendo, os números sete e doze são muito recorrentes na mitologia Gheldoriana. Sete é considerado o número perfeito, porque é a união dos três mundos com os quatro princípios, e fazer algo com sete partes é considerado fazer algo pleno (como uma peça com sete cenas ou uma sinfonia com sete movimentos). Os Gheldorianos acreditam que o sete está em toda parte. O som tem sete notas, a luz tem sete cores, uma palavra deve ter sete intenções, uma casa tem sete cômodos (cozinha, sala, quatro do dono da casa, quarto de familiares, sala de refeições, lavatório e dispensa, embora pessoas ricas tenham casas com vinte e um, ou quarenta e nove cômodos), e assim por diante. O número doze é considerado o número da divindade, porque indica os quatro princípios em cada um dos três mundos. Tudo o que é místico e misterioso, para eles, deve ter o número doze, e religiosos mais fanáticos procuram deliberadamente pelo número em textos e imagens sagradas. Existe um baralho de sete naipes e doze cartas diferentes chamado Hakkur, que dizem poder revelar o futuro e qualquer segredo. |
Cardan Disse:
“Ther’andrinn cresceu rapidamente, e Marnya governou a cidade com benevolência, organizando e ajudando as almas. Porém, logo as almas cresceram em número e tornaram-se mais do que ela poderia organizar sozinha. Quando isso começou a acontecer, Gheldor recebeu a vinda de seis outros Ardrans, que vieram ajudar Marnya em seu governo. Eles foram: Goliath, Haramur, Serganna, Alausir, Thelok e Cardan, quem está lhes falando”.
“Goliath apareceu sobre uma grande montanha de altura inigualável, e fez o gelo desta montanha derreter e um imenso rio se formar. Quando ele veio, o chão de Gheldor tremeu e as almas souberam que havia chegado aquele a quem a terra rende homenagem”.
“Haramur apareceu com uma luz cegante que fez com que o próprio Ardelion deixasse de brilhar por um tempo, e quando ele veio, uma onda de fogo devastou a terra e uma grande área desértica foi formada, e as almas souberam que havia chegado aquele a quem o fogo rende homenagem”.
“Serganna apareceu em uma noite quando a luz do mar competiu com a luz do Sol, e ela ergueu-se das profundezas em uma coluna de água que gerou uma imensa onda que varreu as praias de Ther’andrin. E as almas souberam que havia chegado aquela a quem a água rende homenagem”.
“Alausir veio descendo dos céus em uma luz branca, quando as núvnens do céu brigaram entre si e uma dança de raios recaiu sobre a terra, fazendo tremerem as almas e silenciando qualquer som. E as almas souberam que havia chegado aquele a quem o Ar rende homenagem”.
“Thelok veio em um carro feito de luz, cercado por seis outras grandes esferas de luz que giravam ao seu redor de forma errática, e quando desceu as almas começaram a falar sobre o que não sabiam, e realizarem feitos impossíveis. E as almas souberam que havia chegado aquele a quem os três mundos não oferecem mistério e que tudo pode”.
“Quando eu, Cardan, vim, o céu estava claro e Ardelion brilhava ao alto, mas minha chegada fez-se ouvir pelo espírito de todos, e todos silenciaram perante minha presença. E as almas souberam que havia chegado aquele quem lhes ensinaria os segredos do mundo natural e das línguas”.
“Os sete Ardrans reuniram-se no palácio de Marnya, e concordaram em chamar toda a terra por onde haviam descido de Ther’andrin, não somente a cidade. E juntos, dividiram Ther’andrin entre si e governaram em conjunto orientando os desígnios das almas”.
Faldor e o primeiro julgamento[]
Cardan Disse:
“Então veio a Gheldor um Ardran que não desejava, como os outros, guiar as almas, mas desejava experimentar o mundo como elas. Seu nome era Faldor”.
“Faldor recebeu permissão dos outros Ardrans para ficar em Gheldor e morar com as almas. Porém, como não desejava ajuda-las, não coube a ele nenhuma tarefa, e ele ficou livre para agir como quisesse. Faldor ressentiu-se de seus irmãos, porque achava que estes estavam lhe retirando o seu direito, como Ardran que era, de trabalhar junto das almas, mas estes lhes responderam: ‘Já que viestes para viver como uma das almas, viva como uma’, e isso lhe enfureceu, mas ele se submeteu a este julgamento”.
“Ora, para nós, Ardrans, o tempo corre muito mais rápido, e logo as almas viventes tornaram-se tão numerosas que nem todas podiam recorrer a um Ardran para ajudar-lhes a resolver os conflitos que elas encontravam umas com as outras. Faldor, que vivia com as almas, resolveu ensinar-lhes uma arte que lhes permitiria resolver seus conflitos, e assim, ele ensinou as almas a lutarem”.
“Quando os outros Ardrans viram as almas lutando e se batendo entre si, chamaram Faldor para o templo de Theolanvirannen e lá fizeram seu julgamento. O julgamento de Faldor foi amplamente documentado e constitui uma série de preceitos de jurisprudência que guiaram pelo resto da vida de Gheldor os tribunais e júri. Marnya, a mãe do mundo, foi julgar Faldor pelo crime cometido. Porém, Haramur, que se queimava de piedade por seu irmão, disse que Faldor era ignorante, porque se soubesse o que fazia, não teria cometido seu crime. Sendo ignorante, não poderia defender a si mesmo, e portanto ele, Haramur, ofereceu-se para falar por Faldor, porque ele conhecia a Justiça, tendo reputação irrepreensível. Marnya, porém, disse que se assim fosse, era necessário que outra pessoa o acusasse, porque o mundo é dual, e quem julga não pode acusar sem incorrer em erro. Então Serganna, que era fria como o gelo, ofereceu-se para acusar Faldor”.
“Marnya então decidiu que eu, Cardan, deveria registrar o que ocorria, para que as gerações futuras pudessem se aproveitar de justiça feita naquela hora, e Cardan assumiu o posto de Hiridar, registrador da Justiça”.
“Alausir, sábio e sagaz, apontou que Marnya não poderia chegar a uma conclusão imparcial se julgasse sozinha, porque uma pessoa pode cometer erros de percepção devido a conceitos pessoais, mas era preciso que outra pessoa lhe auxiliasse apontando as falhas de argumentação dos dois defensores. Marnya então, lhe designou segundo Juiz, e disse que o mundo era Dual, e era preciso que alguém lhe opusesse para que, os três juízes, chegassem a um consenso claro. Assim, o sólido Goliath foi apontado terceiro juiz, e coube a ele a tarefa de observar a solidez dos argumentos dos defensores”.
“Por fim, Thelok observou que os juízes perfeitos não poderiam intervir no julgamento, mas deveria haver um condutor que mediasse o julgamento, indicando quais argumentos eram provenientes de uma defesa legítima, e quais eram provenientes do ego dos defensores, e mediando todos. Assim, Thelok foi eleito mediador do julgamento, e com sete lugares preenchidos, o Julgamento teve início”.
“Este modelo foi seguido mais tarde, e todos os estilos de julgamento depois deste utilizaram, pelo menos, de sete figuras que considerassem a posição do Réu”.
“O julgamento de Faldor durou três dias e quatro noites. Faldor defendeu-se argumentando que o mundo de Gheldor é um mundo de luta, e se as almas não aprendessem a lutar entre si, não poderiam superar a si mesmas. Argumentou que o governo dos Ardrans estava deixando as almas cômodas, e elas não aprendiam as coisas por necessidade, e sim porque os Ardrans queriam que elas aprendessem. Sem conhecer necessidade, elas não sentiam o impulso de melhorarem, e assim, jamais poderiam voltar a ouvir a música de Iulan. Faldor agiu atendendo uma necessidade das almas, e, assim sendo, seu ato foi tão natural quanto a chuva ou a maré”.
“Mas Serganna contra-argumentou que todo o conflito precisa ser visto de sete ângulos antes de ser considerado encerrado, e uma luta elimina uma das partes, impedindo a troca de intenções e assim o conhecimento. Sem conhecimento, o conflito fica sem solução, e está destinado a ocorrer várias vezes mais. Ensinar as almas a lutarem atrasou-lhes a chance de evolução mostrando-lhes um caminho imperfeito que não seria jamais o correto”.
“Por fim, os Ardrans chegaram à conclusão que Faldor agiu de forma contrária aos desígnios de Iulan, e, portanto, deveria receber um destino que lhe impossibilitasse de continuar a espalhar a mesma desgraça. A pena a ele imposta foi a perda de seu nome até que ele encontrasse uma alma que lhe entregasse outro”.
“Faldor ressentiu e odiou seus irmãos por lhe haverem retirado a sua própria essência, e procurou em toda Ther’andrin por alguém que lhe desse um nome. Mas todos sabiam do desígnio dos Ardrans, e ninguém lhe ajudou”.
“Por fim, Faldor saiu de Ther’andrin e amaldiçoou seus irmãos e irmãs, e jurou vingança. E os Ardrans, quando ouviram as palavras de Faldor, lamentaram o destino e a raiva de seu irmão, e choraram a queda daquele Ardran, e por sete dias o mundo foi coberto por espessas nuvens, e por toda parte chuvas pesadas caíram”.
Zenare e Korgoth, e a primeira guerra[]
Nomes
Por toda a mitologia de Gheldor, as coisas recebem nomes. Crê-se que um nome dá substância a algo, e algo sem nome não existe. Somente o Demiurgo não possui nome, porque é o criador dos nomes. Até mesmo Iulan, criador do universo, possui nomes. Por isso, os Gheldorianos acreditam que quem dá nome a alguém tem poder e responsabilidade sobre este alguém, e em Gheldor, o pai de uma criança não é quem dá origem biológica à mesma, mas sim quem lhe dá o nome. A maternidade é reservada à mãe biológica, mas qualquer um pode ser pai de uma criança, desde que lhe dê um nome. Da mesma forma, uma pessoa pode permitir que outra lhe dê um novo nome, assim efetivamente trocando de pai. Esta é a hereditariedade que conta nos casos de sucessão e herança. Também é comum as pessoas, especialmente viajantes, assumirem pseudônimos e nunca contarem seu nome de nascimento exceto a amigos íntimos. Quem tem seu nome tem poder sobre você. Dar seu nome de nascimento a alguém é, em Gheldor, prova de uma forte amizade. Em algumas regiões, além da pena tradicional para os crimes, o réu é condenado a perder o seu nome. Com isso, ele perde direito a todas as suas posses, e, dizem, sua alma deverá vagar pelo mundo até encontrar quem lhe dê um novo nome. |
Cardan Disse:
“Havia naquela época uma aluna de Thelok chamada Zenare. Ela soube do destino de Faldor, mas ao invés de se afastar dele, ela decidiu aproximar-se. E Zenare o seguiu através do oceano que ele cruzou até terras desconhecidas, e o encontrou caído e com o espírito quebrado, e consolou-o em sua perda”.
“Zenare deu a Faldor um novo nome, e o chamou Korgoth. Korgoth reconquistou a si mesmo, e ambos tornaram-se grandes amantes, e chamaram a terra que habitaram de Verkia”.
“Zenare e Korgoth tiveram um casal de filhos, chamados Niala e Arayn. Arayn apaixonou-se por Niala, e ambos resolveram casar-se como seus pais. Niala e Arayn não eram Ardrans, pois tinham uma mãe mortal, e não eram mortais, pois tinham um pai Ardran. Eles foram chamados de Kalari, porque eram apenas meio iluminados”.
“Niala e Arayn ouviram as histórias de seus pais sobre as almas e os outros Ardrans e passaram a detesta-los. Quando seus pais dormiam, ambos traçaram um plano para se vingarem dos Ardrans, e comandaram os quatro elementos para formar seres poderosos que tinham os quatro princípios, e, portanto, um espírito, mas não eram uma alma. Estes seres saíam deformados da terra e eram tão diversos quanto sua criatividade lhes permitia, e eles os chamaram ‘Kiroth’”.
“Niala e Arayn, porém, não pretendiam usar os Kiroth para destruírem Ther’andrin, isso não passava por sua cabeça, porque para eles, Ther’andrin era sua casa por direito. Eles usariam os Kiroth para forçarem as almas a lutarem, e com isso, aumentarem o poder de seu pai sobre elas”.
“Certa noite, Niala e Arayn deixaram seus pais e rumaram a Ther’andrin com seu exercito, o primeiro exército de Gheldor, e o que seguiu, foi a primeira guerra registrada”.
“Nos dias que se seguiram, as almas conheceram pela primeira vez a violência gratuita, e o medo pela própria vida. As almas que sabiam lutar, ensinadas por Faldor, formaram a primeira linha de defesa, e começaram a ensinar outras tantas a lutarem também”.
“Os Ardrans, vendo isso, perceberam a corrupção que seria espalhada entre as almas, e se reuniram e foram visitar Niala e Arayn em seu acampamento. Naquela noite (os ataques somente aconteciam às noites, porque Niala e Arayn temiam uma luta sob a Luz de Ardelion) ocorreu o ‘Apelo à Paz’ dos Ardrans, considerado por eras a vir um dos mais completos diálogos sobre a Paz e Justiça”.
“Mas o apelo dos Ardrans terminou em um impasse, e a batalha seria retomada no dia seguinte. Mas Niala e Arayn discutiram durante o dia seguinte, pois Niala era da opinião que seu objetivo só poderia ser obtido quando os Ardrans se percebessem subjugados pela luta, e para isso, eles deviam atacar Marnya, a mãe do mundo, e derramar seu sangue em Ther’andrin. Já Arayn era contra a idéia, argumentando que este não era o jeito certo, pois forçar os Ardrans a lutarem não daria poder a Korgoth sobre eles, isso somente ocorria com as almas”.
“Na noite seguinte, então, Niala saiu sozinha e enfrentou Marnya, tomada de surpresa, no palácio de Theolanvirannen, que até aquela noite só havia conhecido a Justiça”.
“Marnya foi, então, ferida, e desta ferida ela veio a falecer. A revolta desta desgraça tomou Alausir por completo, e ele envolveu Niala em uma chuva de relâmpagos que ergueram-se por quilômetros de altura, e puderam ser vistos e ouvidos por toda a terra de Ther’andrin, destruindo Niala”.
“Arayn, tomado de revolta, virou-se contra os Ardrans. Estes, por sua vez, estavam contendo Alausir para que este não contra-atacasse Arayn. Porém, entre Alausir e Arayn, golpes foram desferidos, e o pesado Goliath caiu sob a terra, e pereceu. Atônitos, os Ardrans deixaram Alausir enfrentar Arayn, mas Arayn havia observado-o e estudado-o antes, e usou sua fúria contra ele mesmo, vencendo-o”.
“Depois da derrota de Alausir, Arayn disse: ‘Aqui termina minha vingança, que eu matei aquele que matou minha esposa, porque não queria matar como ela. Aqui vocês perderam três irmãos, e eu perdi minha mulher, e por não conseguir viver sem ela, perdi a mim mesmo na ilusão dos quatro pecados. Eu me perdi pela Justiça, e no final de tudo, eu não tenho mais nada. Agora eu me vou. Esta terra não podia entender o seu Amor, minha Niala, e por isso eu me junto a ti nos céus’. E dito isso, ele pegou uma lança, e cravou-a em seu peito, trespassando a si mesmo e a Niala com ela”.
“E naquela noite, quando os Ardrans enterraram seus três irmãos caídos, queimaram os corpos de Niala e Arayn, e a fumaça que se ergueu manchou nos céus um reflexo difuso da face de ambos, e desde dia em diante, Niala e Arayn passaram a correr pelos céus de Gheldor, de dia e de noite, buscando eternamente a luz de Ardelion, sendo que dos dois, Arayn é quem a toca mais vezes, e Niala, a impetuosa e apressada Niala, corre mais que Arayn, mas poucas vezes chega a tocar Ardelion”.
A vingança de Korgoth[]
As tarefas dos Ardrans
Cada um dos sete ardrans teve uma tarefa e um título na antiga Ther’andrin. Marnya foi chamada a Mãe de Gheldor, e cuidou da organização do reino e distribuição de recursos. Por causa dela, em Gheldor, é a mulher, não o homem que são consideradas “donas” da casa, decidindo o que deve ser feito e quando. Uma casa pertence a uma mulher. O homem, quando se casa, ganha o direito de morar em sua casa. O homem trabalha para obter os recursos, e a mulher cuida de utilizá-los no lar e com a família. Goliath foi chamado mestre da terra, e construiu cidades e ensinou as pessoas a minerarem e extraírem recursos, trabalharem a terra, plantarem e à marcenaria. Haramur foi chamado mestre do fogo, e ensinou às pessoas o trabalho com metais, ferro, a lapidação das jóias, a transformação dos elementos e propriedades medicinais das ervas. Serganna foi chamada mestra da água, e ensinou às pessoas a pesca, sobre o respeito à natureza, a navegarem os mares e cozinharem os mais diversos pratos, ensinando sobre temperos e condimentos. Por causa dela, a grande maioria das populações costeiras são excelentes cozinheiros, e por toda Gheldor comer é considerado um ato sagrado. Alausir foi chamado mestre do Ar, e ensinou as pessoas a cantarem, esculpirem, a representarem e a realizarem todas as artes. Ele introduziu o riso como o momento divino de uma alma, e o momento da risada como o momento de comunhão com Iulan. Thelok foichamado mestre da natureza. E ensinou às pessoas como utilizarem sua mente para terem memória perfeita, verem coisas além dos olhos, ouvirem sem ouvidos o coração dos outros, e desvelarem os segredos do tempo. Seu templo, chamado templo de Thelok-Ergor, foi assim chamado pela ênfase que Thelok tinha de ensinar apenas à noite “quando as almas podem ouvir sua própria música”, deixando o dia para os outros Ardrans trabalharem. Cardan foi chamado mestre dos nomes, e é tido como guardião de Gheldor, porque ensinou as pessoas a lerem e escreverem, e, portanto, foi quem deu nome à maioria dos substantivos. Cardan também ergueu uma imensa biblioteca (a biblioteca de Car’andrin) e compilou todo o conhecimento de sua época em escritos. A língua arcaica de Gheldor é chamada Cardinar, e a ela é atribuído o controle dos elementos da natureza. Crê-se que Cardan codificou todas as leis naturais em fonemas e sílabas desta língua. |
Cardan Disse:
“Quando Niala e Arayn expiraram e deixaram Gheldor, todas as almas sentiram a ira de Korgoth, que fez com que a terra tremesse por três dias seguidos. E foi Korgoth quem, crendo na injustiça da morte de seus filhos, impediu-lhes a essência de retornar a Elausir e os fez as duas Luas de Gheldor”.
“Nos dias que se seguiram, tempestades, maremotos, erupções e vendavais assolaram todo o território de Gheldor, criados pelo pesar de Korgoth. Afinal, depois de vinte e um dias, a ira de Korgoth cessou de agir sobre os elementos, e Gheldor conheceu um silêncio e uma inatividade como nunca antes vistas, e pelo mês que se seguiu, nem uma chuva caiu, nem um vento soprou, e nem uma grama cresceu. Todo o mundo havia parado, como que esperando a resposta de Korgoth à morte de seus filhos”.
“Por fim, Korgoth saiu das terras de seu lar, que ele chamara Deveroth, e voltou a Ter’andrinn, e lá chegando, dirigiu-se às almas, e ele as chamou de ‘humanos’. Ele deu um nome às almas viventes, até antes inominadas, e com isso, ganhou poder sobre todas as almas”.
“As almas, a princípio, ficaram confusas. O nome que Korgoth lhes havia dado definiu seu papel no mundo e selou sua existência com uma forma definida. A certeza e clareza que esta definição lhes deu foram o bastante para que várias almas aceitassem o nome dado por Korgoth sem pensar novamente. Algumas, porém, questionaram-se por que os Ardrans não o haviam feito antes, e foram perguntar-lhes quando a esta questão”.
“Foi Thelok quem lhes respondeu: ‘Vocês não pertencem a este mundo, por isso não lhes demos um nome. Aceitar um nome deste mundo é pertencer a este mundo, se vocês aceitarem o nome de Korgoth, vocês farão parte de Gheldor, e conhecerão a efemeridade desta vida, conhecerão a doença, a velhice, a dor e a morte’. E as almas viventes entenderam o motivo, mas ainda assim sentiram-se tentadas pela oferta de Korgoth, porque em seu íntimo, já chamavam a si mesmas pelo nome por ele criado”.
“Então os Ardrans, percebendo o destino que aguardava as almas viventes, resolveram oferecer-lhes uma chance de ainda manterem a memória da vida superior que tinham antes de Gheldor, e cada um deles as deu um nome diferente. Haramur as chamou ‘denorianos’, Serganna as chamou ‘valusianos’, Thelok as chamou ‘elerianos’, e eu, Cardan, as chamei ‘endimianos’, e as almas que assumiam para si mesmas um ou outro nome, lentamente começaram a conhecer a morte, e a vida se foi delas. Mas aquelas que aceitaram os nomes dados pelos Ardrans mantiveram alguma memória, e ergueram-se acima das limitações do mundo físico”.
O Êxodo dos Ardrans[]
Cardan Disse:
“Mas os Ardrans perceberam mais, e viram qual o futuro que aguardava os seres viventes, agora que eles aceitaram nomes mortais, e por isso começaram a treinar os mais próximos a si nos preceitos da jurisprudência, filosofia, administração, economia e matemática”.
“E então aconteceu que Korgoth, falando aos humanos, lhes disse: ‘Os Ardrans lhes enganaram. Eles não queriam que vocês conhecessem a luta, e por isso vocês morreram na batalha que e seguiu, e eles não queriam que vocês tivessem um nome, mas depois que eu lhes dei o meu, eles logo deram-lhes nomes deles. Eles tem inveja de vocês, e pretendem impedir seu desenvolvimento. Eles lhes dão tudo o que necessitam, mas fazendo isso os impedem de tomarem suas próprias escolhas, de escolherem algo melhor. É preciso que eles dêem seu lugar a vocês, para que vocês sejam senhores do seu próprio destino, e escolham a vida que querem ter sem que eles lhes imponham nada. A luz deles é tão forte, que perto dela, a sua é uma sombra, e enquanto eles estiverem entre nós, vocês nunca poderão brilhar’. E isso fez sentido a muitas almas, e essa mensagem se espalhou por entre todos os seres viventes, não só os humanos, e eles começaram a ressentir-se dos Ardrans”.
“Um dia, descontentes com nossa orientação, várias das almas viventes aproximaram-se dos Ardrans e exigiram que eles deixassem, daquele dia em diante, que governassem a si próprios. E os Ardrans lhes responderam que iriam embora, e chamaram todos aqueles que quisessem para ir com eles, para longe, além das vistas mortais. Mas só o fariam depois que os seres escolhessem, entre eles, quem iria ficar em seu lugar, e o fizessem de forma pacífica”.
“E os seres viventes escolheram Korgoth para governar no lugar dos Ardrans”.
“E os Ardrans cumpriram sua palavra, e foram embora de Ter’andrinn. E entre todos os seres viventes, apenas doze mil resolveram seguir-lhes, e eles partiram para o oceano, para as terras de Ardra, para não serem vistos por muito tempo”.
A queda de Korgoth[]
Cardan Disse:
“Korgoth tornou-se o imperador de Ter’andrinn, e passou a governar com sua esposa, Zenare, que havia aceitado o nome de humana. E por um tempo, tudo esteve em paz, e eles tiveram quatro filhos: Neutor, Ardok, Taria e Andrin”.
“Porém, sem os outros Ardrans, Korgoth tornou-se solitário. Pouco ele conduzia os negócios da cidade, e a habilidade dos humanos em governar, ensinada pelos Ardrans pouco antes de sua partida, foi gradualmente expondo-se como mais sábia que as poucas sugestões de Korgoth”.
“Finalmente, Korgoth tornou-se uma figura decorativa no palácio. Suas ordens eram seguidas, mas distorcidas para acomodarem-se ao que seus regentes achavam ser o mais correto. Sem experiência ou conhecimento para fazer melhor, e orgulhoso demais para aceitar sua diminuição, Korgoth tornou-se amargo, e falava cada vez menos. Começou a ter acessos de raiva, e suas explosões faziam a terra tremer e os céus trovejarem, causando vários desastres com as colheitas, caça e pesca”.
“Logo, manter o humor do Imperador passou a ser a ocupação de todos no palácio, mas Korgoth via por trás de cada agrado uma preocupação apenas com as colheitas e com as vidas deles próprios, e a cada nova tentativa de agrado, ele tornava-se mais fechado, e sua ira crescia”.
“O medo passou a reinar no palácio na noite em que Korgoth sufocou um dos seus criados por que a água de seu banho estava quente demais”.
“Acuados e apavorados, o regentes tramaram a morte de Korgoth, e o atacaram certa noite quando dormia. Porém, Korgoth pressentiu a traição, e depois de nocauteá-los, arrastou-os pelo chão do palácio, trancou o mesmo impedindo a entrada e saída de qualquer pessoa, e começou a decepar os membros de todos os habitantes do palácio, um a um”.
“Durante todo este tempo do governo de Korgoth, a pessoa mais próxima a ele sempre foi Zenare. Quanto mais Korgoth se fechava do mundo, mais Zenare se aproximava dele, e cuidava de seu marido com uma paixão tão devota, que hoje crê-se que o governo de Korgoth só tenha durado os doze anos que durou devido à proximidade de Zenare, que o acalmava com um mero olhar”.
“Ora, quando Korgoth trancou-se no palácio de Theolanvirannen e começou a asassinar todos que encontrava, toda a população de Ther’andrinn rebelou-se e marchou para o palácio para dar um fim a Korgoth”.
“Mas Zenare, que estava fora do palácio quando tudo isso ocorreu, colocou-se à frente das portas do palácio, diante da multidão enfurecida, e implorou perdão ao seu marido. Apelou aos habitantes de Ter’andrinn que lhe dessem mais uma chance, pois ela sabia que ainda havia sabedoria em Korgoth”.
“Mas a turba não se rendeu aos apelos de Zenare, pois para cada apelo que ela fazia, uma pessoa mais gritava dentro do palácio. E ela, que recusou-se a sair da frente do palácio, que tentou proteger seu marido até o fim, foi arrastada pela multidão, e amarrada a um poste enquanto os soldados de Ter’andrinn, que aprenderam a lutar com Korgoth, entraram no palácio, lutaram com seu primeiro mestre, e o subjugaram, e o criavaram de lanças por três horas até que seu corpo parasse de se debater, e queimaram o que restou”.
“Zenare foi solta logo depois, enquanto assistia a cremação do corpo de seu marido antes da hora, e atirou-se nas chamas, e morreu consumida pelo fogo enquanto abraçava seu esposo e chorava”.
A era dos Kalari[]
Cardan Disse:
“Após a morte trágica de Korgoth e Zenare, o povo te Ter’andrinn se reuniu e elegeu um novo Imperador, chamado Erdren”.
“Edren assumiu o Império em idade avançada, e governou por vinte e três anos até sua morte. Durante seu governo, o povo de Ter’andrinn conheceu uma relativa paz, e nenhum grande evento sacudiu o Império”.
“Após a morte de Erdren, foi eleito Imperador Ardok, o segundo filho de Korgoth e Zenare, que, por ser um Kalari, não passava pelo tempo como os outros seres mortais, e governou Ter’andrinn por vários séculos”.
“Ardok governou usando de habilidades e poderes impressionantes para os mortais, e em nenhum momento foi desafiado em seu governo. Tamanha foi a força dos efeitos que causava, que duzentos anos após tomar posse, instituiu que os governantes de Ter’andrinn, daquele dia em diante, deveriam todos pertencer à família dos Kalari, que eram quem detinha a maior força sobrenatural de Gheldor”.
“Ardok governou ao todo por setecentos e dezesseis anos, e teve um governo bastante pacífico, sobre o qual o povo de Ter’andrinn prosperou e espalhou-se por todo o continente que ocupava (que recebeu o mesmo nome da capital: Ter’andrinn)”.
“Mas o mais importante foi que, em seu governo, foi instituída a linhagem dos Kalari. E dali por diante, todos os governantes passaram a ser descendentes de Korgoth e Zenare”.
“A princípio, os descendentes mais diretos eram supremamente poderosos, mas conseguiam lidar com seu poder demonstrando também uma elevada sabedoria nas ações. Porém, conforme o tempo foi passando, o sangue dos Ardrans foi se misturando cada vez mais ao sangue dos seres mortais, e cada nova geração de Kalari que nascia era um pouco mais fraca que a anterior, e muito menos sábia”.
“Depois de dois mil anos de governo, os Kalari haviam se tornado um povo dotado de poderes excepcionais, e entregue aos mais baixos impulsos. Os outros seres haviam sido separados por nome e eram usados em tarefas pré-determinadas pelos Kalari. Não havia mais liberdade de escolha para quem não fosse da família real, e até mesmo esta era limitada por um jogo de interesses políticos e emocionais dos governantes”.
“Ter’andrinn havia se tornado uma terra de trevas, e a corrupção dos Kalari não conhecia mais fim. Os mais criminosos atos e as mais baixas perversões da natureza tornaram-se lugar comum, e os Ardrans, que observavam a tudo de fora, decidiram que era hora de intervir”.
A queda de Ter’andrinn[]
Cardan Disse:
“Por três mil Anos Ter’andrinn floresceu em Gheldor, e em três noites ela se acabou”.
“O povo foi avisado. Um mês inteiro antes do fim, uma chama branca brilhou nos céus de Ter’andrinn. Ao fim deste tempo, a grande cidade foi devastada pelo fogo. Grandes terremotos seguiram que destruíram todas as outras cidades do continente. Ondas imensas varreram as cidades costeiras, e o céu foi coberto de travas por três dias”.
“Os governantes de Ter’andrinn todos morreram na primeira hora. A destruição, logo após, foi varrendo gradativamente os outros habitantes, e ao fim se três dias, o grande continente aonde Theolan deu a si pelo mundo foi transformado em um imenso cemitério, aonde até hoje as almas daqueles que foram enterrados vivos vagam sem descanso, e, dizem, o céu nunca mais brilhou sobre Ter’andrinn”.
“Mas antes do cataclisma, antes mesmo da chama branca aparecer no céu, décadas antes, os seres de Ter’andrinn começaram a ser avisados em sonho pelos Ardrans. E dentre os poucos que acreditaram nos sonhos, alguns começaram a espalhar o aviso aos outros”.
“Estes foram perseguidos e mortos pelos Kalari, mas os sonhos só ficaram piores, e logo, várias pessoas avisavam umas às outras do que estava por vir, e muitos, com medo do fim de Ter’andrinn, partiram daquela terra com barcos para todas as direções”.
“E foi assim que, quando Ter’andrinn foi devastada, milhares de pessoas já haviam sido salvas, porque acreditaram em seus sonhos, e fugiram para as outras terras de Gheldor. Algumas foram para norte, para Rainor, outras foram a Leste, para Deveroth, antigo lar de Korgoth, outras foram para Sul, para Ardran, procurando os Ardrans que se ocultaram do mundo, ou para sudeste, para as ilhas de Dalamar que ficavam além do oceano de névoas, mas a grande maioria partiu para oeste, para as terras que viriam a ser conhecidas como Argaron, e não mais voltaram para Ter’andrinn, pois aquela havia se tornado, pelos feitos dos Kalari, uma terra maldita”.